segunda-feira, 24 de outubro de 2011



A afetividade na relação pedagógica *

José Manuel Moran

Especialista em mudanças na educação presencial e a distância

É muito difícil equilibrar controle e liberdade, autoritarismo e afetividade. Em grupos grandes a tendência é a olhar mais a norma do que as pessoas, a regra do que as circunstâncias. Os limites são importantes, mas a relação pedagógica afetiva é fundamental. Aprendemos mais e melhor quando o fazemos num clima de confiança, de incentivo; quando estabelecemos relações cordiais com os alunos, quando nos mostramos pessoas abertas, afetivas, carinhosas, tolerantes e flexíveis, dentro das regras organizacionais.

Pela educação podemos ajudar a desenvolver o potencial que cada pessoa tem, estimulando suas possibilidades e diminuindo suas limitações. Um caminho importante é mostrar atitudes de compreensão e estar atentos para superar a intolerância, a rigidez, o pensamento único, a desvalorização dos menos inteligentes, dos fracos, dos problemáticos ou “perdedores”.

Praticar a pedagogia da inclusão de todos e de todas as formas. A inclusão não se faz somente com os deficientes, ou com os marginalizados. Dentro da escola muitos alunos se sentem excluídos pelos professores e colegas. São excluídos pelos professores, quando nunca falam deles, quando não lhes dão valor, quando são ignorados sistematicamente. São excluídos quando falam com e dos mesmos e descuidam os demais. São excluídos quando exigem de pessoas com dificuldades intelectuais, emocionais e de relacionamento, os mesmos resultados.

Há uma série de obstáculos para superar: a formação intelectual que valoriza mais o conteúdo, o intelecto, a razão. Professores e gestores frequentemente possuem uma formação emocional, afetiva deficiente. Por isso, tendem a enxergar mais os erros que os acertos. Salários baixos e falta de reconhecimento também dificultam o equilíbrio emocional, a auto-valorização, a boa auto-estima.

Por isso, ao mesmo tempo que se implantam políticas efetivas de valorização profissional, é importante organizar atividades, cursos e programas com gestores e professores para que todos desenvolvam a autoconfiança, a auto-estima. Gestores acolhedores facilitam muito o clima emocional da escola. Profissionais valorizados se sentem melhor e contribuem mais.

Para que os alunos tenham certeza do que comunicamos, é extremamente importante que haja sintonia entre a comunicação verbal, a falada e a não verbal, a comunicação gestual, a que passa pela inflexão sonora, pelo olhar, pelos gestos corporais de aproximação ou afastamento. As pessoas que tiveram uma educação emocional mais rígida, menos afetiva, costumam ter dificuldades também em expressar suas reais intenções, em comunicar-se com clareza. Falam de forma ambígua, utilizam recursos retóricos como a ironia, o duplo sentido, o que deixa confusos os ouvintes, sem conseguir decifrar o alcance total das intenções do comunicador.

Os educadores que gerenciam bem suas emoções transmitem equilíbrio, tranqüilidade e objetividade. Falam com tom calmo, e quando discordam, o fazem sem agredir nem humilhar. Os alunos captam claramente as mensagens e mesmo quando não concordam, manterão o vínculo afetivo, o relacionamento e continuarão abertos para novas mensagens.

As pessoas equilibradas, abertas, nos encantam. Antes de prestar atenção ao significado das palavras, prestamos atenção aos sinais profundos que nos enviam, de que são pessoas compreensivas, confiantes e abertas a novas experiências e idéias.

* Este texto faz parte do meu livro A educação que desejamos: Novos desafios e como chegar lá. 4ª ed. Papirus, 2009, p. 55-59 (com pequenas modificações).

A Linguagem Oral e Escrita com Base na Pedagogia Freinet






A prática na educação infantil, como em outros níveis de ensino, goza de uma certa autonomia, o que demanda da escola e do professor responsabilidade e conhecimento, como, por exemplo, se optarmos por trabalhar com o método natural da Pedagogia Freinet no processo de ensino e aprendizagem da escrita e da leitura. Nessa opção, o adulto não t...ransfere conhecimentos, mas ajuda e estimula a construção do conhecimento. O ponto de partida é sempre a expressão livre da criança que aprende a ler e a escrever como aprende a andar, falar, desenhar, cantar.

Primeiro as crianças expressam livremente seus pensamentos pela fala, depois pelos desenhos, em seguida pela escrita, pelo reconhecimento de palavras e frases e finalmente pelo reconhecimento e compreensão, ou seja, pela leitura propriamente dita. Não se exploram grafemas e fonemas logo de início, mas quando a criança demonstra seu interesse natural por eles.

Para desenvolver a escrita e a leitura, a criança passa por algumas etapas: o desenho livre para que ela perceba que só ele não basta para se expressar; a incorporação ao desenho de tentativas no uso de letras; o uso de letras estabelecendo relação com os sons; o domínio e o uso da escrita correta de algumas palavras, até descobrir que já sabe escrever.

Segundo Freinet, o desenho é uma das formas de expressão da criança, uma espécie de vocabulário, e também uma atividade experimental por excelência. O grafismo inicial vai se organizando e ganhando significado. A criança sente, então, necessidade de explicar melhor, passando a se interessar por outros sinais, imitando letras e palavras. Todo um caminho é percorrido até que ela compreenda como se constrói e como funciona a escrita e a leitura.

Freinet propõe técnicas que permitem essa construção de forma ativa e dinâmica: textos livres, Livro da Vida da classe, jornal, fichário, aula-passeio, imprensa e computador, biblioteca de sala; leitura de histórias, brincando com as palavras.

As estratégias aqui descritas e exemplificadas possibilitam às crianças situações variadas de aprendizagem em situações reais de comunicação, permitindo-lhes o crescimento pessoal e social.

As Etapas e os Exemplos

Deixar a criança falar, desenhar são etapas para o desenvolvimento da leitura e da escrita, pois após organizar seu pensamento e automatizar seus traços, logo perceberá que só o desenho não basta, procurando se expressar também através da escrita.

- A criança começa a produzir seu grafismo aleatoriamente. Ao ser questionada dá uma explicação para o seu desenho. Se algum grafismo tiver semelhança com uma forma que a criança verbaliza, essa forma passará a ser repetida.

- Percebemos que a criança vai incorporando ao seu desenho uma tentativa de escrita, imitando a postura do professor, no sentido de fazer a história do desenho. Como coloca Freinet, é comum neste momento a criança despertar para o reconhecimento de letras, de nomes conhecidos (o seu, o da mãe, o do pai, o do irmão, o do amigo) fazendo uma leitura global e bastante afetiva.

- A criança domina a escrita correta de algumas palavras e começa a utilizá-las em suas escritas.

- A criança copia muitas palavras com segurança, rapidez e perfeição. Ela utiliza-se do fichário que permite uma memorização das palavras que contém um valor afetivo, pois funciona como um referencial na hora de escrevê-las. Esse fichário é construído com caixinha de gelatina, pelas crianças, com a ajuda da professora.

- A criança continuará suas tentativas, chegando à perfeita tradução escrita da linguagem oral da referida palavra. A escrita vai se aperfeiçoando cada vez mais, principalmente se o meio lhe oferecer estímulos e a “ajuda” necessária. A criança descobre que já sabe escrever, comunicar-se, expressar seu pensamento. Seus textos já podem ser lidos e compreendidos sem dificuldade.

Os exemplos mostram que a aquisição da leitura e escrita dá-se de forma global, ou seja, a criança parte das palavras que conhece e aos poucos constrói seu próprio caminho para a apropriação da linguagem escrita.

A passagem do desenho à escrita se dá após uma série de experimentos intermediários. A criança vai tentando e tentando, sem que o ato tenha qualquer intenção; o grafismo sem forma organiza-se. Aos poucos vai surgindo uma crescente precisão em seus gestos e ela percebe que o que fez se parece com algo (determinado objeto). Automaticamente repete várias vezes o mesmo desenho (tentativa experimental) aperfeiçoando cada vez mais seu grafismo e sua lógica de explicação.

“Não dê nenhum conselho, não julgue... Contente-se em se interessar pela obra realizada, que sempre tem grande parte de originalidade, utilize-a para fazer a criança falar, para estimulá-la a se exteriorizar e a se socializar”. (Freinet)

Este artigo apoiou-se em experiências realizadas na Escola Oca dos Curumins, São Carlos, SP, e em práticas e trabalhos de colegas, empenhados na tarefa de educar com base nos princípios e técnicas da Pedagogia Proposta por Freinet, no sentido da construção de uma escola democrática para uma sociedade verdadeiramente democrática.

Maria Fátima Luchesi Martins e Rita de Cássia Rosa Miassi

* contribuição: Maysa Borges de Castro

sábado, 8 de outubro de 2011